sábado, 8 de outubro de 2011

Aeroporto


Volto meu olhar pela terceira vez, quase inconveniente, suponho.
Que cores são as cores daqueles olhos? Onde e quando foi que eu por ali me perdi? Que eu por ali não soube sair quando ainda era possível?

Não!
Ela não é uma mulher que eu conheça, mas meu coração não compreende quando seus olhos não me respondem. E eles não me respondem nunca. São olhos fixos na imagem do lugar para onde ela vai embarcar, provavelmente. Talvez pense num amor. Talvez seus olhos narcisos estejam fixados no reflexo de seu rosto na vitrine do magazine onde ela aparece tão linda.

Mas porque seus olhos parecem tristes? Não há pelo menos nenhum brilho ou emoção sobre a viagem. Como não há felicidade, então, em voar? Para qualquer lugar que seja! Por qualquer motivo! Mas cadê felicidade? Felicidade alguma! Mas pra que felicidade numa mulher tão bela?

A felicidade em embarcar está em mim, que vôo pela primeira vez. Nela não há emoção, tampouco ineditismo no aeroporto. Talvez seja habituê de vôos semanais, ou diários.

Onde está ela agora? Não a vejo depois que retorno dos lugares por onde fui. Por que fui tão longe com meus pensamentos e me perdi do cenário do aeroporto? Afinal, porque me desespero tanto com a ausência de uma alma que meus pensamentos nem sequer sabem quem é? E se soubessem, o que saberiam?

Mas me desespero igual. Preciso da imagem novamente como quem precisa do ópio. Pelo menos mais uma olhadela, nem que seja a última. Ólho sobre a proteção do segundo piso e redescubro outra vez o contentamento. A mulher e sua pouca bagagem caminham em direção ao embarque.

Vai se ausentar por pouco tempo da cidade, imagino.
Que besteira, talvez nem seja daqui, e só esteja de passagem.
E se ela não voltar, ou se voltar e eu não encontrá-la? E se encontrá-la, o que iria lhe dizer? Uma infinidade de bobagens, uma receita completa de como ser feliz em 10 lições? Um turbilhão infindável de assins e senões?

Ou talvez eu lhe diga que nos últimos meses estive demasiadamente ocupado com toda sorte de coisas e me esqueci de olhar para uma mulher bonita feito ela. Ou que estive propositadamente absorvido por números e letras inúteis para esquecer de amar o amor descontraído. O amor desocupado das tardes de domingo.

Retorno de meus pensamentos e descubro que a perdi novamente. Procuro e não a vejo, mas sofro menos agora. Afinal, seus ouvidos não me ouvem, ou se ouvem, ouvem outra melodia. Uma melodia de uma música distante, irremediavelmente distante dos meus ouvidos e do meu corpo. A chuva fina aumenta. Engrossa. O avião sobe suavemente. Adeus mulher que não me viu.

2 comentários:

  1. Obrigado, Dagmar.
    Na verdade, preciso dizer que este é um texto de gaveta. Resolvi publicá-lo com algumas alterações. E mesmo depois de postado aqui, ainda assim fiz uns ajustes. Talvez faça outros.

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